Qualidade no atendimento ou “Um Dia de Fúria”?

Pode ser que você tenha assistido ao filme “Um Dia de Fúria” em um final de semana, com um pacote de pipoca nas mãos. Aproveitou depois para dar uma passeada no Shopping. Talvez você tenha alugado uma fita ou DVD na locadora de sua preferência e assistido ao filme no conforto de sua casa. Na verdade quando e onde você assistiu ao filme não interessa muito. Interessa como você assistiu ao filme se você é uma pessoa preocupada com atendimento. Nos últimos anos tenho lido textos utilizado em atividades de treinamento sobre atendimento que falam do filme e da cena onde William Foster, interpretado por Michael Douglas, entra em uma lanchonete do Mc Donald´s e pede um café da manhã. Logicamente não foi atendido. E este foi o motivo para que provocasse um atendimento forçado, com uso de metralhadora.

O exemplo é bom. Acontece que mais forte que a cena de atendimento do filme é o sentimento de perda, de agressão, de roubo, que milhões de pessoas sentem diariamente por absoluta ausência de sensibilidade de pessoas e das organizações que representam, em relação ao atendimento. Este sentimento é possível extrair de quase todo o filme. E é este sentimento que acaba se transformando em fúria. Individual ou coletiva, contra as mesmas pessoas e organizações que o provocaram.

O método da repetição espaçada é reconhecidamente eficaz quando aplicado no processo de ensino-aprendizagem. Se você repete centenas de vezes o conteúdo que deve ser incorporado ao conjunto de conhecimentos, habilidades e atitudes, de uma pessoa, ou de um grupo, ao final de dias, meses ou anos, este conteúdo estará verdadeiramente incorporado, no mínimo ao campo dos conhecimentos. Acredito que a maioria dos educadores, até mesmo de forma acidental, aplique este método.

Então você pode ser levado a acreditar que a forma mais objetiva de provocar a incorporação de conteúdos relacionados com atendimento é repetindo conteúdos. Dezenas ou centenas de vezes. A questão é que sua equipe pode passar por mil horas de treinamento, em sala de aula, em estúdio, no posto de trabalho. Ela saberá listar os cento e cinqüenta fatores que podem gerar insatisfação no cliente, identificará os passos para conquistar um serviço de qualidade, relacionará, em segundos, as dez regras do atendimento de sucesso. Mas se nada ocorreu no campo das atitudes, o resultado de todo seu esforço de treinamento terá sido igual a zero. E se sua equipe não é sensível às questões de atendimento por ausência de atitude, talvez seja mais fácil você mudar de equipe.

Sabemos que mudanças de comportamento, só ocorrem através de ferramentas que provoquem alterações de atitude. A sensibilidade às questões de qualidade e mais especificamente de qualidade no atendimento, somente passa a ser real, em todos nós, a medida em que passamos a agir ou manifestamos, de forma clara, o propósito de agir para atender, auxiliar, ajudar, orientar, enfim de gerar satisfação aos nossos clientes.

O que muitos consultores tentam fazer ao tratar de atendimento é simplificar um tema complexo. Ele envolve conteúdos relacionados com sociologia, psicologia, administração, direito, pedagogia, medicina, religião e outros. Passa pela leitura de sistemas de crenças e valores das organizações, de seus integrantes e de seus clientes, dos conceitos de gestão adotados e da forma como eles são interpretados por todos os que interagem com clientes.

O atendimento é um magnífico campo de pesquisa exploratória, que exige revisão permanente e que deve ter início no processo de planejamento, como forma de obter consenso e comprometimento da alta administração em relação a sua real importância. Deve ser incorporado a todos os planos operacionais, porque de certa forma o atendimento acontece em todas as funções e cargos da organização. Começa dentro da empresa, onde uns são clientes de outros. Se estende aos processos de recrutamento e seleção, uma vez que devem ser identificadas prioritariamente pessoas predispostas a atender. E deve chegar aos clientes com um forte componente integrado à identidade corporativa, a partir de um esforço também permanente, de educação para a qualidade, de todos os funcionários e mais diretamente daqueles que têm a função específica de atender.

Podemos acreditar em milagres, mas é muito exagero acreditar que em cursos de vinte horas, sejam solucionados problemas graves de atendimento, em inúmeras empresas que atuam no Brasil. É um despropósito e uma agressão à inteligência corporativa utilizar o modelos simplificados de treinamento e desenvolvimento quando o assunto envolve muito mais que processos, procedimentos. Envolve comportamentos e sentimentos, ações e reações. Sempre é uma boa hora para agir para buscar melhores níveis de atendimento. Sempre é uma boa hora para evitar “Um Dia de Fúria” no coração de seus clientes.

E se você não assistiu ao filme, faça-o, com olhos de uma pessoa preocupada com atendimento.