A redundância dos fornecedores de produtos cosméticos para Salões de Beleza

Por Jorge Márcio Daniel

Temos atuado junto a fornecedores de cosméticos para Salão de Beleza desde 2003. Muitos trabalhos realizados ofereceram excelentes resultados, pela melhoria de atitude de grandes homens de vendas, mas os modelos comerciais estratégicos continuam inalterados. Talvez este seja um dos principais entraves para ampliação das vendas das marcas que concentram sua comercialização no canal Salão de Beleza.

Um percentual muito alto das marcas que atuam nesse segmento não consegue ver o Salão como verdadeiro negócio e pior, os agentes comerciais continuam com o perfil de meados do Século XX, quando a metodologia AIDA, ainda hoje muito difundida, era a responsável por 100% do progresso de uma força de vendas. AIDA se refere às iniciais das palavras atenção, interesse, desejo e ação, uma forma de lembrar os passos da venda que seriam:

  1. Conquiste a “Atenção” do possível cliente.
  2. Desperte o seu o “Interesse”.
  3. Crie o “Desejo” de compra ou aquisição.
  4. Vá para “Ação” de fechamento.

É lógico que este método pode funcionar, mas como uma fórmula para pressionar o cliente a tomar uma decisão que seja favorável ao fornecedor. Pode estar distante daquela que seria uma decisão boa para o cliente. O objetivo de criar o desejo é muito diferente do objetivo de identificar reais necessidades do cliente.

No processo de “criar o desejo” o vendedor vira uma enciclopédia ambulante, falando desesperadamente no ouvido do cliente do quão importante é o seu produto para o  negócio, da relação custo benefício, da qualidade, do suporte técnico, treinamento e tudo mais que aparece como argumento de venda nesta hora. Claro que funciona. O vendedor recebe sua comissão, no terceiro mês não consegue vender mais nada, reclama da situação, vai embora e deixa o abacaxi com o salão. Pode até continuar na empresa e vendendo para o mesmo cliente, mas o potencial de compra do cliente é  caracterizado por uma reta e não por uma curva ascendente. Isto acontece porque quando a receita de um salão mais antigo estabiliza, tende a reproduzir uma média histórica. Podem acontecer variações em função da entrada e saída de profissionais, reformas, mudança de proprietário, local, dentre outros, mas depois de um tempo o salão estabiliza novamente em torno de um número.

Então se o vendedor vende mais que a capacidade de absorção do cliente, os produtos giram de forma lenta por alguns meses, respeitando o ciclo de negócios natural daquele salão. Como muitas vezes o salão permanece três meses sem comprar fica desatendido pelo vendedor, que muitas vezes desaparece. A carteira de salões desatendidos em muitas distribuidoras é grande e chega a representar 80% do total de clientes cadastrados.

Dezenas de milhares de salões ficam com estoques desnecessários e, normalmente, com uma grande compressão de capital de giro. Na competição baseada em preços as coisas ficam ainda piores, porque as ofertas são diárias. Todo dia um milagre novo, uma nova estratégia para criar desejo e não para atender necessidades. Com isto as distribuidoras também têm muita dificuldade para reter talentos e a força de vendas se torna volátil, ou é achatada pela mediocridade.

Também é curioso que quando um gestor de salão define sua linha de atuação em relação a fornecedores, sempre há um vendedor que tenta provar o quanto ele está errado. É uma insanidade, além de uma completa falta de respeito.

Isso deixa claro que não adianta empurrar produtos, mas o que fazer para incrementar vendas junto a salões?

É exatamente aí que reside a solução. A pergunta abre espaço para a construção de novos paradigmas fundamentais à concepção de um futuro mais favorável para todos.

O que sabemos sobre isto?

  1. A grande maioria dos salões pode, no mínimo, dobrar a receita.
  2. Estes salões precisam de ajuda para crescer.
  3. O que menos eles precisam para crescer é ficar com estoques abarrotados e sem dinheiro no caixa.

Há quatro pontos de suporte prioritário que os salões necessitam:

  1. Pessoas qualificadas: Há uma enorme deficiência de mão de obra qualificada para o segmento. Isto inclui gerentes, supervisores, cabeleireiros, manicures, podólogos, maquiadores, auxiliares, recepcionistas, caixas e outros. O catálogo de cursos técnicos do PRONATEC deixa claro que o Técnico em Imagem atua como autônomo; O SENAC vem atuando historicamente na produção de cabeleireiros profissionais autônomos, que eventualmente viram empresários, mas quem vai formar mão de obra para a base operacional dos salões que cresceram? Qual o conceito hierárquico a ser seguido? Quem vai resolver a questão jurídica que há neste meio? Quando? A que custo? Quem vai arcar com este custo? Então ao invés de empurrar produtos os fornecedores devem se debruçar sobre esta questão e prestar suporte, inclusive em pontos que exigem interferência política.
  2. Treinamento permanente em todos os segmentos de especialização técnica e  prioritariamente em desenvolvimento gerencial. Se os salões recebessem suporte no desenvolvimento gerencial, como o SEBRAE vem fazendo em muitos lugares, tudo aconteceria de forma mais veloz, mas o SEBRAE também precisa da colaboração das empresas. O perfil de empresa predadora, facilmente encontrada no segmento de salões, dificulta o trabalho do SEBRAE e a velocidade de correção das unidades de produção. O SEBRAE ajusta e as empresas fornecedoras desajustam os salões.
  3. Suporte no ajuste estratégico da operação: o salão precisa de visão estratégica de Marketing, Finanças, Recursos Humanos, Gestão de Operação, como qualquer outra empresa. É falsa a premissa de que um salão pode ser gerido de qualquer forma, basta reunir bons profissionais e está tudo resolvido. É um paradigma que pode servir à retórica de proprietários de salão que se tornaram profissionais de renome no século passado. Não serve para novos profissionais e para novos empreendimentos. Os fornecedores precisam prestar suporte ao desenvolvimento estratégico do negócio.
  4. Questões trabalhistas e tributárias: a grande maioria dos agentes econômicos envolvidos no processo faz de conta que está tudo certo, mas todos sabem que há problemas sérios para serem resolvidos. Então, ao invés de “empurrar o problema com a barriga” é fundamental criar cenários alternativos, novos modelos de negócios, ampliar a discussão sobre os formatos jurídicos, trazer o Ministério Público do Trabalho para as discussões de uma forma proativa e não reativa como acontece atualmente em vários estados. É possível perceber uma completa dissintonia entre Ministério Público do Trabalho, Ministério do Trabalho e suas delegacias, sindicatos patronais, de autônomos e de empregados, Previdência Social, Receita Federal, secretarias de finanças dos estados e dos municípios e outros neste particular. Como fazer crescer um segmento cheio de incoerências e incorreções jurídicas? É uma questão mais ampla, mas sobre a qual os fornecedores não podem ficar de fora.

Enquanto os fornecedores estiverem ocupados em aumentar a participação numa receita de até R$ 10.000,00 que caracteriza algo próximo a  75% dos salões no Brasil, há pouca possibilidade de crescimento para a venda de cosméticos no segmento. É por isto que as maiores empresas investiram no “faça você mesmo”, uma alternativa para sair deste “imbróglio”.

Há, no entanto, na ambiguidade das ameaças enormes oportunidades. Se um segmento se encontra altamente pulverizado, mas há nele foças de alavancagem, ele se torna um segmento de grande oportunidade. É assim que se encontra hoje o segmento de Salões de Beleza, mas a reformulação estratégica dificilmente virá de agentes do próprio segmento, imersos em paradigmas redundantes. A reformulação virá através de agentes externos que, a par destas enormes oportunidades, com a participação direta ou não dos atuais fornecedores do segmento, desenvolverão iniciativas semelhantes àquela operada pelo Salão Beleza Natural e sua marca de produtos cosméticos, a Cor Brasil.

Assim sendo, dentro de uma visão macro estratégica, não é que o segmento de salões não tenha condições de crescer, pelo contrário, ele reúne condições para crescer fortemente e isto só depende da mudança de visão estratégica dos fornecedores do segmento. Numa única frase é possível resumir: para crescer o segmento precisa bem mais de estrategistas do novo milênio do que de vendedores apegados ao milênio passado.

Esperamos que até 2020 o mercado produza uma dezena de bons exemplos.